sexta-feira, 17 de setembro de 2010


Trago a vocês mais uma pauta que produzi. Quem costuma a se deslocar diariamente de carro, depara-se todos os dias com os flanelinhas. Odiamos-os? Sim. Achamos que são folgados? Sim. Mas, alguém já parou pra pensar sobre a realidade deles? Muitos sustentam suas famílias com este ofício tão odiado pela maioria dos motoristas.



A Realidade dos Flanelinhas




Ao estacionar seu carro em via pública, seja no centro da cidade ou em qualquer outro lugar mais movimentado, lá estão eles para auxiliá-lo. Os tomadores de conta, ou popularmente flanelinhas, trabalham como autônomos. Oferecem atividades como lavagem e localização de vagas para carros a fim de ganhar um trocado por esse tipo de serviço. Eles ficam na rua cotidianamente, sob sois escaldantes, e correm risco de vida durante noites desérticas, tudo, com o objetivo de receber um trocado.
“Tem gente que não reconhece meu trabalho, mas daqui que tiro meu sustento”, diz Paulo Cézar, que há oito anos trabalha como flanelinha no mesmo local. Na pracinha onde fica, mostra o que sobrou do escritório improvisado que havia montado. Parte foi varrida pela prefeitura, e queimada por outros flanelinhas que tentaram se estabelecer em seu local de trabalho. Lá, ao mesmo tempo em que escreve poesias, Paulo toma conta dos carros estacionados e faz amizade com todos que passam pela região. “A polícia daqui me dá a maior força”, fala sobre o apoio que recebe.
Segundo Paulo, a profissão é bem arriscada. Quando vê pessoas suspeitas se aproximando dos carros, ele dá um jeito de conversar, para saber de suas intenções. Mas, dependendo da situação, às vezes, liga pra polícia. “Em 2004, colocaram um revólver na minha cabeça e levaram o carro”, conta Paulo sobre incidente em que quase perdeu a vida. Mas, feliz, conta que gosta do que faz — “o pessoal daqui me trata como uma família”.
A respeito do dinheiro que arrecada, Paulo conta que não pede nada, e que cabe ao dono do carro reconhecer seu serviço e avaliá-lo — “Tem uns flanelinhas que exigem, e não é por ai, a rua é pública e dá dinheiro quem quer. Já cheguei a receber R$ 100 em época de Natal”. A colocação de cones em vias públicas é outro item polêmico no trabalho dos flanelinhas. Paulo diz que só coloca cones na rua quando é para guardar vagas para deficientes. Além disso, ele ajuda as pessoas a carregarem compras como uma espécie de serviço auxiliar ao que já faz na rua.





Legalização da atividade


Em agosto deste ano, a Prefeitura de Belo Horizonte regulamentou a atividade de lavador e guardador de carro. O reconhecimento por lei federal e municipal dessas atividades ilegaliza a atividade de flanelinha em logradouro público, sujeitanto-o à fiscalização e à aplicação de sanções. A lei já existia, mas só neste ano o código de postura se tornou expresso.
A prefeitura tem acompanhado o cumprimento da lei. O guardador ou lavador de carro deve usar jaleco e crachá registrado no SINTRALAMAC (Sindicato dos Trabalhadores, Lavadores, Guardadores, Manobristas, e Operadores de Automóveis em Estacionamentos Particulares e Lava jatos do Estado de Minas Gerais). Para o melhor cumprimento da lei, a Polícia Militar também tem acompanhado na verificação da atividade.
Ao guardadores de carro é proibida delimitação de vagas com cones nas ruas. A população pode recorrer à denuncia caso isso venha ocorrer, e o trabalhador pode chegar a perder sua licença dependendo do caso.





Regulamentado

Lúcio Lourenço, 38, é registrado como guardador de carro há oito anos. Com um molho de chaves pendurado na calça, expõe a confiança que seus clientes têm. Quando preciso, aplica rotativos nos carros que ficam sob sua responsabilidade.
Há três anos, o irmão de Lúcio, Edson Castor, 30, após sofrer um acidente se cadastrou na atividade. É pai de duas filhas e não viu alternativa como trabalho. “Nem todo mundo dá dinheiro, mas sobrevivo disso aqui”, afirma Edson.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Trago à vocês uma matéria que fiz com minha parceira Nayara Carmo no Leuceminas. É uma casa de apoio, não-governamental que faz tratamento de pacientes com leucemia.


Leucemia e o Preconceito

Mesmo com o reconhecimento da cura e a não infecção por contato físico, a doença ainda gera preconceito na sociedade


“O preconceito ainda existe, só está disfarçado”, afirma Luciana Matozinhos, 36. Ela é filha de Antônio Matozinhos, fundador da Casa Leuceminas no bairro Caiçara em Belo Horizonte. Ele fundou a casa de apoio logo após descobrir que a filha era portadora de leucemia. Hoje, Luciana está curada, grávida, e é auxiliadora na casa que ajuda mais de 300 portadores da doença por ano.

Luciana detalha como o preconceito é vigente na sociedade “quando vou ao médico e digo que já fui leucêmica, eles já me olham de maneira estranha e parecem nem acreditar que estou curada”.

Ela conta como a falta de informação agrava o preconceito na sociedade. Muitas pessoas acham que a doença é transmissível apenas pelo contato físico. “Algumas pessoas chegam aqui e têm receio de beber um copo de água ou comer da mesma comida que os demais”, diz Luciana.

Ela também fala como o preconceito se faz mais presente nas classes média e alta. Algo estranho, já que são classes que têm maior acesso à educação e informação.

“A classe baixa parece mais preparada para enfrentar o problema, ela se comove e sente o que está acontecendo”, diz Luciana.

Ela acentua que esse quadro muda apenas quando surgem doentes nas famílias de classe alta, “só assim é que os ricos passam a se importar mais com os doentes, passando até mesmo a visitar a casa”.

O preconceito pela leucemia atinge todas as idades de diversas formas. Dentro de ônibus, restaurantes e escolas. Luciana conta como teve que enfrentar o preconceito durante sua adolescência “tive que estudar oito anos com professores particulares por não poder ir à escola”. Ela fala que para uma criança ou adolescente, a escola que deveria ser o apoio e a distração, acaba sendo seu tormento. “É mais fácil trocar a criança da escola do que mudar a cabeça de todos ao seu redor”, fala.

Uma das principais consequências do preconceito é o trauma psicológico. Além do tratamento contra a doença, muitas vezes é necessário tratamento psicológico com os pacientes que se sentem excluídos da sociedade.

Ana Luíza, 29, é paciente da Casa Leuceminas há cinco anos “Já tive que sair de dentro de um restaurante para comer no passeio por causa dos olhares das pessoas”, conta.

Por causa dos sintomas do tratamento, como o inchaço, a leucemia muitas vezes é confundida com outras doenças, agravando assim o preconceito.

De acordo com a Constituição, quem pratica preconceito pode sofrer sanções na esfera civil por danos morais e na esfera penal por calúnia, injúria e difamação. “É algo que pode e deve ser combatido”, diz a advogada Graciela Ribeiro.